domingo, 12 de outubro de 2014

"Foi de repente. Dois quadros que tenho na parede da sala despencaram juntos. Ninguém os havia tocado, nenhuma ventania naquele dia, nenhuma obra no prédio, nenhuma rachadura. Simplesmente cairam, depois de terem permanecidos seis anos inertes. Não consegui admitir essa gratuidade, fiquei procurando uma razão para a queda, havia de ter uma.
[...]
Um belo dia a gente se olha no espelho e descobre que está velho. A gente acorda de manhã e descobre que não ama mais a uma pessoa. Um avião passa no céu e a gente descobre que não pode ficar parado onde está nem mais um minuto. Zás. Nossos pregos já não nos seguram.

Costumamos chamar essa sensação de "cair a ficha", mas acho bem mais poética e avassaladora a analogia com os quadros na parede. Cair a ficha é se dar conta. Deixar cair os quadros é um pouco mais que isso. É perder a resistência, é reconhecer que há algo que já não podemos suportar. Não precisa ser necessariamente uma carga negativa, pode ser uma carga positiva, mas que nos obriga a solicitar mais força dentro de nós.

Nascemos, ficamos em pé, crescemos e a partir daí começamos a sustentar nossas inquietações, nossos desejos inconfessos, algum sofrimento silencioso e a enormidade de nossa paciência. Nossos pregos são feitos de material maciço, mas nunca se sabe quanto peso eles podem aguentar. O quanto podemos conosco? Uma boa definição de felicidade: Ser leve para si mesmo."

- Martha Medeiros em "Pregos"




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